Bom, segue o momento de falar dos contras. O que poderia ser mais contra que a própria saudade?
O maior problema desses 10 meses foi lidar com uma saudade tão grande e de tantas coisas e pessoas ao mesmo tempo. Porque eu já estava acostumada a lidar com alguma saudade, como a de meu avô na mesa de almoço... mas era uma saudadezinha aqui, outra ali... nada tão gigantesco como a saudade de todos e de tudo...
Sou o tipo de pessoa que quando me dava na telha de ver alguem, eu simplesmente entrava num onibus e ia ver. Aqui a palavra “simplesmente”se transformou em “dificilmente”... tudo aqui é dificil... e depois de 10 meses aqui a minha opinião (que fique claro que é opinião e não uma verdade) é que não há brasileiro feliz morando nos EUA, há brasileiro acostumado com os EUA e até com um certo medo do Brasil, da nossa “selva”de diversidade.
Não acredito nem que haja americano feliz, porque quem não conhece a felicidade não pode sentir falta dela e nem saber que ela não se encontra em sua vida.
O que me faz acreditar em tudo isso?! Simples! Onde não há comunidade, não há fraternidade, não há amor... e talvez seja por isso que a maioria dos brasileiros que morem aqui, como os mexicanos, os filipinos e outros, procurem logo a comunidade de sua terra, ou uma igreja... pois é o mais próximo que se pode ter de comunidade e enfim ter 1/4 da felicidade que eu estava acostumada a ter no RJ. Se você assiste Friends e acha que vai chegar aqui e ter ½ duzia de pessoas que vão ser seus amigos, jantar na sua casa, assistir um filminho numa tarde chuvosa, está enganado. Aqui o buraco é mais embaixo, tempo é dinheiro e amigos amigos negócios a parte.
Sei que todo esse discurso parece pessimista e talvez precipitado para uma pessoa que passou apenas 10 meses no lugar, mas eu sou o tipo de pessoa que acredita nas primeiras impressões e também dá muito valor as mudanças das primeiras impressões, coisa que nunca aconteceu comigo nem com nenhuma brasileira que conheci aqui em Las Vegas. Nenhuma delas me disse: - um dia vai melhorar, um dia vc vai ser bem aceita, um dia vc vai ter amigos. Não. Todas elas me ensinaram a arte de viver sozinha, não confiar em ninguém, e que sempre me tratariam diferente pois sou e sempre serei “mexicana”. (porque aqui em Las Vegas todo mundo que é de outro país é mexicano, acho que até os chineses...rs)
Tudo isso me deu essa saudade imensa das coisas simples, de sentar no sofa de casa pra assistir TV com minhas amigas, chamar meu amigo João pra comer la em casa quando minha mãe tava viajando só pra ter a companhia agradável dele e depois comer uma bomba de chocolate na parme. Coisas assim, simples... o onibus, a feira, a praça, a Lapa, o buteco, a livraria, o ccbb...
Passando essa parte, outra dificuldade foi a alimentação. Cheguei aqui vegetariana, comendo super bem, e acabei por desisitir da minha dieta vegetariana por falta de opção e um pouco de frio também. Legume e verdura aqui é coisa de gente rica, fruta uma porcaria, tem gosto de nada. As únicas frutas que prestam e que eu me empanturrei são as vermelhas (morango, framboesa, blueberry, amora). E legumes e verduras são bons, mas caros (se você, como eu, é adepto aos organicos). E dalhe brócolis e abobrinha até os borbotões... Quando chegar em casa não quero ver brócolis e abobrinha por um bom tempo. Carne é ruim e sempre vai ser ruim, como meio que entojada sabe?! Mas tenho que admitir que o sushi é um momento de alegria... (mas também é muitooo caro)
Outro problema foi a tentativa de ser assistente social aqui... eu quase que tenho que fazer faculdade de novo. O serviço social é sim uma profissão local, quem fez faculdade na América do Sul, não poderá (com facilidade) exercer a função na América do Norte. E adivinhem só o agravante?! Eles queriam que eu pedisse pra minha faculdade no Brasil escrever uma carta detalhada de todas as disciplinas que eu cursei, em inglês, é claro. Agora imagina eu pedindo pra UFRJ isso... parece piada... mais piada era eu tentando explicar pra tiazinha que atendeu o telefone do Conselho dos EUA que a minha faculdade era publica e que dificilmente eu encontraria alguém pra redigir esse milagre que ela estava me pedindo. A tiazinha falou muito educadamente: - ok. Quando vc resolver esse problema volta a ligar. (Tu tu tu)
A tentativa de ser baba pra uma assistente social também foi um Deus nos acuda, porque eu como baba sou otima assistente social, fico dando pitaco em tudo. O bom foi que encontrei uma mãe louca que gostava de pitacos, mas demorou um pouco até eu acha-la. (acho que ela era diferente das outras porque era de Nova York, todo mundo me diz que o povo de NY é diferentão mesmo)
Ainda tinha os probleminha, ou melhor as comédias da minha vidinha... bicicleta quebrada no meio da rua, tombo de bicicleta, 5 horas esperando onibus que não tinha lugar pra minha bicicleta, neve em Las Vegas depois de 30 anos, um frio do cão e eu de bicicleta, onibus quebrado, onibus lotado, onibus vazio com só mais um passageiro bebado e drogado me olhando de maneira esquisita, trocador mexicano fazendo piada do meu ingles, tombo de bicicleta, andar com o bebe num frio de bater queixo, andar com o bebe num calor escaldante, a brisa daqui que parece o bafo de um dragão, blackout no dia mais frio do ano = sem luz, sem aquecimento, sem fogão, colocar 20 roupas pra atravessar a rua e ir a casa da minha vizinha, chegar a casa da vizinha tirar 10 das 20 roupas, entrar, conversar 5 minutos e colocar as 10 roupas faltantes pra atravessar a rua de volta pra casa, desistir de ir a casa da minha vizinha, ventania, tombo de bicicleta, chegar numa academia do tamanho da Lapa e não ter lugar pra malhar, fazer sauna com chinesa fedorenta e pelada, fazer yoga na sauna com muitas pessoas fedorentas, ouvir as conversas sobre silicone no banheiro da academia, sair da academia de bicileta cansada e já de noite, tombo de bicileta, realizar que eu tenho mais cicatrizes na minha perna hoje do que eu tinha quando criança, começar a planejar a mudança, no mês de calor a La Poderosa resolve não funcionar o ar condicionado, passar horas na caminhonete cozinhando, comprar caixas, comprar roupas, comprar cansa... encaixotar... e cá estamos... encaixontando! Último estresse de Las Vegas...
E que venham os problemas e as graças da nova fase da vida....